O fim do jejum
Por seis votos a três, o Supremo Tribunal Federal autorizou ontem o governo a retomar as obras de transposição do rio São Francisco. Ao saber da decisão no meio da tade, o bispo da cidade baiana de Barra, dom Luiz Flávio Cappio, que completava ontem o 23º dia de jejum contra a transposição, desmaiou e foi internado em uma Unidade de Terapia Intensiva de Petrolina (PE). Ele está semiconsciente.
Indagado se o bispo o autorizara a dizer que a greve de fome acabara, o médico Klaus Finkam foi incisivo: “Sim, ele me autorizou”. A ONG Articulação do São Francisco Vivo (contrária à obra) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) insistiram em que o jejum não acabou e essa decisão só pode ser tomada pelo bispo, quando voltar plenamente à consciência. Mas à noite, João Franco Cappio, irmão do bispo, reafirmou a O Estado o fim do protesto: “Só quem pode falar pelo frei Luiz é a família e o médico. A greve de fome acabou”, afirmou.
Os repórteres Bernardo Mello Franco e Gerson Camaroti, de O Globo, informam que o Vaticano ameaçava punir dom Luiz se o jejum continuasse. Segundo a reportagem, a Santa Sé passou a tratar o assunto como um problema de Estado envolvendo o governo brasileiro. O Vaticano planejava indicar um novo bispo para a diocese de Barra.
No julgamento de ontem, a maioria dos ministros do STF considerou que o governo cumpre satisfatoriamente os requisitos para realização da obra e que o Judiciário não pode interferir na escolha e na definição de políticas públicas. Um dos votos contrários à decisão, mostra O Globo, foi do único ministro nordestino da corte, o sergipano Ayres Cunha. Ele disse que o rio São Francisco está morrendo e precisa ser recuperado antes de se fazer a transposição. “Na dúvida, se paralisa a obra. Não se pode exigir que uma pessoa doente (no caso, o rio) seja doadora de sangue”, afirmou Cunha.
A atriz Letícia Sabatella, estrela da campanha publicitária contra a transposição, disse à Folha que a decisão do STF foi uma “humilhação”. “É humilhante para o povo brasileiro ficar sob esse nível de insensibilidade, tanto do nosso governo como do nosso sistema Judiciário”, disse a atriz. Em frente ao STF, manifestantes cantaram, dançaram, desfilaram e, ao final, fizeram uma oração de mãos de dadas. Também queimaram um exemplar da Constituição. O ator Osmar prazo [sic] se ofereceu para também fazer uma greve de fome.
Em artigo para O Globo, o ex-ministro de Integração Regional e antigo adversário de dom Luiz, Ciro Gomes, publicou artigo em forma de carta para a atriz: “Letícia, ando meio quieto por esses tempo [sic]. Mas, ao ver você visitando o bispo em greve de fome no interior da Bahia, pensei que você deveria considerar. [sic] que (a obra) ao beneficiar 12 milhões de pessoas da região mais pobre do país, não prejudicará rigorosamente ninguém (…). Imagine se um bispo entra em greve de fome exigindo a pronta realização do projeto? Quem nós escolheríamos para morrer? Isto evidencia a necessidade urgente deste debate. Manda um abraço para o Osmar Prado e o Wagner Moura e, por favor, partilhe com eles esta cartinha. Patrícia tem meus telefones. Um beijo fraterno do Ciro”.
Ainda ontem, o governo Lula encerrou as negociações com a CNBB para modificar o ritmo das obras da transposição. Os trabalhos serão retomados pelo Exército em 7 de janeiro, quando os militares retornam do recesso do Natal e do Réveillon. “Aqui [em Brasília] morreu a negociação com o governo. Não tem mais nada para ser conversado”, disse Roberto Malvezzi, agente da CPT (Comissão Pastoral da Terra) e representante de dom Luiz nas negociações com o governo. A repórter Marta Salomon, da Folha, informa que o consórcio integrado pelas empreiteiras Serveng, Carioca e S.A. Paulista venceu a licitação para o primeiro dos 14 lotes da transposição do rio São Francisco, a maior obra do PAC financiada com dinheiro público. Até outubro de 2008, o governo quer anunciar o resultado da disputa pelos demais 13 lotes entregues à iniciativa privada. As empreiteiras deverão receber R$ 3,3 bilhões.
Em artigo para a Folha, Carlos Heitor Cony [blergh...] faz uma crítica demolidora dos métodos (não dos méritos) do protesto de dom Luiz para impedir a transposição: “Tivemos em nossa história alguns momentos que poderiam ter provocado greves de fome: o regime da escravidão, que durou tantos anos, a vacina obrigatória -houve apenas badernas nas ruas-, o golpe de 64, as Diretas-Já, a transferência da capital para Brasília. Conheci no Lins de Vasconcelos um sujeito que fez greve de fome para impedir que o Flamengo vendesse Zizinho ao Bangu”.
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FONTE: Boletim eletrônico diário do jornalista Thomas Traumman, da revista Época.
FOTOGRAFIA: D. Cappio antes do início da greve de fome. FONTE: Web.
NOTA: EM 2008 E 2010, NÃO VOTE NO PT. Muito menos no Ciro Gomes, pelo amor de Deus.
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