Sócrates e Platão. Sócrates, o mestre de Platão, coloca um problema da estética que terá grande futuro no neoplatonismo cristão e que persiste, de modo tênue, até hoje. Ele reflete sobre a tradição popular tipicamente grega que associa espontaneamente o belo e o bem (kalokagathía) e reformula essa tradição com duas proposições análogas que explicitam esse elo como um vínculo natural entre beleza e bondade: o indivíduo que tem valor moral é suscetível de agir belamente, e vice-versa, o indivíduo belo tem a possibilidade de atos moralmente bons. No entanto, acrescenta Sócrates, esse elo não é dado -- estabelece-se com vistas a algo outro: a utilidade, ou seja, é referido a uma finalidade.
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A mesma idéia aparece também nos diálogos socráticos, que nos mostram quanto os cidadãos gregos tiveram apego à beleza concreta, às diferentes coisas belas -- em todos os sentidos: agradáveis, desejáveis, úteis e proveitosas, moralmente boas ou não. Toda a educação grega estava baseada no belo: mitos e relatos épicos, ritos e cerimônias envolvendo objetos (como estátuas) ou danças, cantos de louvor e música comemorando os valores coletivos. Platão parte desses costumes, que são ao mesmo tempo religiosos, políticos e lingüísticos e sintetizam as diversas facetas semânticas do termo "belo" (ton kalón). Progressivamente, seus diálogos submetem o belo a uma investigação filosófica que separa os diversos conceitos e, assim, permite pensar a idéia abstrata do "belo", independentemente dos fenômenos particulares nos quais essa idéia se realiza.
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In: Estética, de Kathrin H. Rosenfield. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2006, pp. 11-12.
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