Creio que não existe nada de mais belo, de mais profundo, de mais simpático, de mais viril e de mais perfeito do que o Cristo; e eu digo a mim mesmo, com um amor cioso, que não existe e não pode existir. Mais do que isto: se alguém me provar que o Cristo está fora da verdade e que esta não se acha n'Ele, prefiro ficar com o Cristo a ficar com a verdade. (Dostoievski)

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15 de jan. de 2008

carta...


Querido amigo,

Venho, por meio desta, agradecê-lo. Não vou dizer o seu nome, mas você sabe que você é você mesmo. Suas palavras de apoio foram importantes pra mim, ontem. Estava muito triste, magoada, irada. E é nessas horas que se conhece um irmão.

Não, não vou banalizar o que aconteceu. Tenho meus motivos, e Deus -- sobretudo Deus -- pode me compreender. Mas é verdade que há uma época, todo mês, que eu chego a duvidar da própria bondade divina. Mas Deus -- sobretudo Deus -- entende, já que esse defeito de fabricação é responsabilidade dele e até agora não tomei conhecimento do recall.

Muita gente me critica porque eu teimo em gostar dos argentinos. É que além do Borges, do Cortázar e do Gardel, existe a Maitena. E com ela eu me sinto totalmente incluída, pelo menos neste período tenebroso. Sim, durante uns dias, todo mês, eu sou uma mulher alterada.

Não quero aqui explicar o que significa TPM. Todo mundo sabe. OK, vou explicar: Treinada Para Matar. Ou Triste Para Morrer. Nunca se sabe qual dos dois estados vai predominar. Na verdade, eu nunca sei que a TPM chegou até me achar parecida com alguma personagem histérica do Woody Allen ou do Almodóvar. E, no entanto, minha velha amiga nunca falha. Se há algo fiel além de Deus e do cachorro, o melhor amigo do homem, é a TPM, a melhor inimiga da mulher.

Deus é muito sábio. Sim, sobretudo Deus. Ele não dá à maioria das mulheres porte de arma nem notável massa muscular. Eu, além disso, não sou uma exímia lutadora de artes marciais e meu carro é modesto. Antes de ontem eu vi, pela enésima vez, Kill Bill, volume II. Passou na TV. Fora a voz ridícula que dublou a Uma Thurman, fiquei bem feliz em ver essa obra-prima de novo. Como é gostoso, na TPM, ver uma mulher colocando ordem na casa. Confesso que fui condicionada a isso desde muito cedo, com esse negócio de direitos iguais, mais a Mulher Maravilha, As Panteras e a Luluzinha, literatura em quadrinhos de conteúdo subversivo. Mas, de modo particular, devo dizer também que a personagem da Uma Thurman em ação já alivia uns 40% da minha TPM. Se eu tivesse um por cento da habilidade dela, acredite, a essa altura metade da vizinhança barulhenta já tinha ido conhecer Jesus, pessoalmente. Sem contar os motoristas que me atrapalham no trânsito, os lerdinhos e os que, diante de um casto palavrão, mandam um beijinho nojento e cínico. Blergh!

Eu até tentei fazer judô e capoeira, mas, que vergonha, não progredi muito. Como tenho preguiça de correr e de fazer ginástica, meu condicionamento físico também não me permite extravagâncias. Prefiro a companhia de uma boa barra de chocolate meio-amargo pra ver a Uma Thurman fazer tudo o que eu tinha vontade de fazer.

Mas a TPM não é só Kill Bill. Dependendo da dieta, do ciclo da Lua e do final da novela posso também ficar bem triste. Aí eu me lembro daquela vaca que na oitava série me roubou a foto do garoto mais lindo da escola. A foto que ele tinha dado pra mim! Nessas horas fico realmente sensível, e os grandes impasses da vida vêm ao meu coração. Por que tomei aquela multa no mês passado? Por que nessas horas todo mundo tem um namorado, menos eu? Por que engordei dois quilos? Por que não aumentam meu salário? Por que não tenho um olho nas costas, pra ver instantaneamente o carro que está, de propósito, logo atrás do meu, no estacionamento? Por que a roupa, as louças e a casa não são autolimpantes? Por que este supercomputador faz tudo mas não sabe preparar comida nem regar as plantas? Por que a Terra é redonda?

Pois é. Tantas perguntas. Todos os dias de TPM são vividos intensamente, pelo menos isso ninguém me tira. Eu sei o que é viver perigosamente. E, o pior disso é que TPM não é pra qualquer um, não. É pra qualquer uma. Deus deveria conceder aos homens algumas dádivas que só nós, mulheres, temos. Ah, quando eu chegar lá vou pedir uma longa audiência com Ele. Se os homens sentissem certas dores, talvez nos compreendessem melhor. Deus, vão aí algumas sugestões: Os homens deveriam dar à luz. Mas só de parto natural, nada de anestesia. Deveriam ter um mês ininterrupto de TPM, uma vez por ano. Todas as guerras seriam resolvidas, não sobraria homem nenhum pra contar história (esse seria o lado péssimo, precisamos deles!). Ah, sim, os homens deveriam fazer depilação. A cera, e fria. Só se consegue ter uma idéia da dor da próxima quando ela é sentida pelo próximo.

Tornando a conversa mais literária, me veio à mente o Dr. Jerkyll And Mr. Hyde, de Robert Louis Stevenson. Acho que tamanha criatividade pode ter vindo de sua mulher e seus dois estados físico-emocionais: sem TPM vs com TPM. Ou talvez tenha sido sua mãe a musa inspiradora. Ou sua tia. Ou qualquer mulher que tenha passado por sua vida, da cozinheira à funcionária da loja de chapéus. Ou Robert Louis Stevenson era Louise Stevenson, falando metaforicamente de si mesma. Pode ter sido outro George Sand, amante de Chopin. Ou Aurore Dupin, seu verdadeiro nome. Explico: Chopin era Frederic Franciszek Chopin, e Aurore Dupin era sua amante, uma controvertida escritora que adotou o pseudônimo masculino de George Sand. Deve ter sido o caso de Robert Louis Stevenson. Mas, além da literatura, vem-me à memória a saudosa série de TV O Incrível Hulk, inspirada na HQ. Sim, ele, um dos personagens mais conhecidos das histórias em quadrinhos. Segundo a Wikipédia (posso estar na TPM, mas cito a fonte), "foi o super-herói da segunda série de estórias [sic] criada por Jack Kirby e Stan Lee, em 1962, dando continuidade à revolução dos quadrinhos iniciada com o Quarteto Fantástico (Fantastic Four). Seu nome verdadeiro é Dr. Robert Bruce Banner." Ou seria Roberta Banner? Sim, meu amigo, aquela transformação que ele sofria era TPM, ninguém me tira essa certeza.

Neste momento escrevo à mão, deitada, e apóio a folha de papel num livro muito bom: O Jesus que eu nunca conheci, do P. Yancey. É grosso e dá solidez suficiente pra que eu possa apoiar a caneta no papel. Agora há pouco pensei que, provavelmente, quando estou na TPM, Jesus deve dizer: "Eis aí a Maya que eu nunca conheci". Sei que Jesus foi tentado em todas as coisas, como ser humano. Sentiu a dor humana de forma pungente e entregou-se a ela, em seu destino inexorável de Salvador da humanidade, a fim de nos dar uma vida nova. Mas eu tenho certeza de que ele nunca teve TPM.

De qualquer modo, amigo, obrigada. Que Deus o recompense por sua bondade.

Um abraço,

Maya

***

NOTA: Mais uma postagem retrô... de 22 de setembro de 2007...

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